30 de agosto de 2011

A estrutura do preconceito

- Olha, Deus que me perdoe o que eu vou falar agora, mas eu não suporto boliviano. Ô raça.
Voiciferava a mulher de cabelos loiros tingidos, modestamente acima do peso.
Dizia como se se arrependesse instantaneamente, por medo do castigo divino, mas sem a menor vergonha na cara.
- Você assiste aquele Polícia 24 horas? Ficam tudo ali na Casa Verde enchendo a cara e arrumando confusão.
- Sério? Eu nunca vi nenhum deles fazer mal para ninguém...
- Sei lá, será que a Bolívia é tão ruim assim que eles tem que vir para cá?
A pergunta foi respondida por ela mesma:
- Se fosse bom eles não viriam para cá né? Mas é pior que aqui?
- Sim, é bem pior que aqui.
- Ah. Tá certo né? Coitados...
- Sim, e aqui eles trabalham como escravos, moram em condições ruins, muitos não conseguem voltar ou mesmo assim é melhor do que morar lá.
- ...
- Na verdade eles são bem assustados com os brasileiros. Uma vez até cheguei a ver um deles sendo humilhado quando trabalhava na feira, chamaram de vagabundo e tudo.
- É, tá certo. São assustados mesmo né? Coitados...
- Eles só querem uma vida melhor, assim como você.

Assim como muitos outros que se abrigam nessa cidade de meu deus.
No diálogo com a mulher se não há o apoio de outras pessoas elas se sentem intimidadas a mostrar o preconceito que tem. Mas eu ainda não entendo como as minorias tem preconceito das também minorias. Talvez seja humano querer ter o poder sobre os menos privilegiados. Mas com certeza é estúpido não se ver como num espelho, aquele que sofre como você.

25 de agosto de 2011

Só.

Agonia não sei do que, ansiedade não sei da onde.
Falta sempre uma parte, e por mais que eu tente encontrar aqui dentro, não acho.
É algo que é só meu, que só eu posso me dar, só desaflora se eu quiser. E não consigo. Impotência, Carência, Desejos e Frustrações.
Quando está nas mãos escapa, foi só ilusão.
Em algum momento se perdeu.
Ilusão de achar que a minha energia estava conectada. Ilusão de não haver cobranças, de que essa pura energia bastaria. Que isso seria liberdade. Que me faria bem. Que eu sempre enxergaria as flores de vermelho vivo. Que a ausência de cheiro era a delicadeza. Que os olhos diriam a verdade. Que a respiração era de cansaço. Que a falta de carinho era esporádica. Que a droga era para a emoção. Que o mundo era o limite. Que eu sustentaria a minha leveza. Que o celular poderia ficar a mostra. Que o líquido era remédio. Que a discussão era válida. Que o futebol é divertido. Que a beleza basta. Que minha auto estima se elevasse. Que eu não teria medo. Que a janela não me faria falta. Que eu não me lembraria...
Como se sempre precisasse renovar minha confiança.
Como se o mundo sempre cobrasse provas.
Nada disso mais importará.
Não importa.
Não me atinge.
Apenas o que é bom, apenas o que foi bonito.

18 de agosto de 2011

A árvore


O Osho me contou que os aborígenes há alguns séculos possuiam o conhecimento de conversar com as árvores. Algumas delas eram usadas como mensageiras. Tipo um telefone. O pai mandava a mensagem para o filho pela árvore e no outro povoado ele ouvia o tal recado. Com o tempo e com os brancos, isso foi perdido.
Nessa época do ano as árvores aqui em São Paulo mostram seu esplendor, e faz um bonito contraste com toda essa cidade suja e cinzenta. Os Ipês roxo são os que mais me agradam. São flores fofas, as que caem no chão formam um tapete mágico, parecem algodão doce nos galhos.
Eu não tenho o poder de conversar com elas. Mas que felicidade elas me trazem.
Numa noite, observamos do portão, em um estacionamento o movimento que ela fazia, o som que ela emitia. E uma palavra resumiu tudo: soberana. Ela era soberana. Ela dizia e mostrava que era a maior. Conversava conosco com o balanço de suas folhas. Exalava seu perfume de mato. Era um pedaço da natureza. Eu entendi a mensagem.



1 de agosto de 2011

A Nega

A cena foi no metrô, casal recém formado, ou amigos que uma hora virarão casal.
- Mas você gosta de jogar bilhar?
- Sim, claro, acho o máximo.
- Mas daquele bola vermelha X bolas amarelas?
- Como assim? Eu jogo ímpares e pares, ou por cor.
- Ímpares e pares? Não seria maior e menor?
- Não oras, sempre foi ímpares e pares, ai tira a bola 1 que depois que é a nega.
- Ah tá, é igual então, só que tira a bola 8.

Mariana: bola 8, bola 8, é a NEGA pooooo!
Mudou minha vida. De verdade. Tudo fez sentido.
Mas eu jogo par e ímpar.